CONTEXTO
As enormes transformações que a indústria da música tem sofrido nos últimos anos levaram a novas dinâmicas de geração de valor, nem sempre benéficas para os artistas. Embora o streaming permita um alcance inédito aos músicos e suas obras pela internet, o faturamento gerado nas principais plataformas não chega a eles.
Em geral, o modelo de negócios hegemônico consiste na criação de plataformas de formato inovador por idealizadores do mundo da tecnologia, cujo objetivo é vendê-las por milhões ou mesmo bilhões de dólares para investidores do Vale do Silício - ou fazer uma abertura de capital igualmente vultosa.
Nesse contexto, músicos que não são famosos encontram muitas dificuldades para ter uma receita estável e continuar criando. Eles não detêm nenhum controle sobre o funcionamento das plataformas às quais estão vinculados e a parcela de ganhos a que têm direito é irrisória, já que o poder e o dinheiro se concentram nas mãos de poucos.
Do ponto de vista funcional, os músicos ficam sob controle dos gestores da plataforma, o que impede sua independência profissional. O público passa longe de ser o foco nesse modelo de negócios, de modo que a qualidade do que está disponível para ele ouvir não é uma preocupação dos controladores das plataformas.
DESAFIOS
Um dos grandes desafios dos criadores da Ampled foi a falta de informações sobre como criar e constituir uma cooperativa, já que nas escolas de administração e direito pouco se ensina sobre modelos alternativos de organizações. Também foi difícil estabelecer e iniciar a plataforma sem receber investimentos de venture capital.
A equipe da Ampled precisava, ainda, determinar uma metodologia de financiamento e distribuição dos ganhos que fosse compensadora para os artistas, algo que não seria fácil de atingir, considerando que não existem iniciativas correlatas no mercado. Ao mesmo tempo, o sistema não poderia ser muito caro para o público apoiador dos artistas.
DESENVOLVIMENTO
A Ampled definiu desde o começo que não olharia para seu negócio com as lentes da obsessão pela riqueza, tendo foco, portanto, naquilo que interessa aos músicos e seu público.
Dessa forma, a empresa não foi registrada nos Estados Unidos como uma C-Corp, o modelo de organização de companhias de tecnologia usualmente voltadas à transferência de controle para investidores em troca de capital para expansão. No lugar disso, a Ampled foi registrada como uma cooperativa, cuja propriedade é de músicos, usuários e trabalhadores.
A plataforma pode receber investimentos, mas eles não dão controle ou poder para os investidores. Um cuidado especial foi tomado para isso. A equipe fundadora procurou a Faculdade de Direito da City University of New York (CUNY) para desenvolver modelos de contrato que protegessem a cooperativa desse tipo de problema.
Foi criada uma estrutura de governança democrática, baseada em três categorias de membros: artistas-proprietários, trabalhadores-proprietários e membros da comunidade, cada uma delas operando na dinâmica de uma pessoa, um voto. Fundadores e investidores devem encaixar-se em alguma delas e nenhuma desproporção no voto lhes dá privilégio.
Em caso de saldo financeiro positivo, a divisão é feita de acordo com critérios pré-definidos: 85% é distribuído entre os artistas-proprietários, e 15% entre os trabalhadores-proprietários.
Cada uma das categorias detém três assentos no conselho de administração da cooperativa, cujas decisões são tomadas de acordo com a natureza do assunto. A estratégia de negócios da cooperativa, por exemplo, é decidida em sistema democrático (a maioria simples decide, mas pode haver veto de um grupo de stakeholders); já decisões envolvendo as estratégias de arrecadação de recursos são tomadas por consenso. A contratação ou demissão de funcionários, por exemplo, é decidida por delegação, ou seja, é conferida autoridade a uma pessoa e ela tem liberdade para decidir.
Todos esses mecanismos foram estabelecidos para garantir um modelo democrático de gestão e a adequada participação de cada grupo na tomada de decisões, além da distribuição equitativa dos ganhos. Hoje em dia, a maioria das pessoas envolvidas na Ampled tem outros empregos.
RESULTADOS
Desde seu lançamento, a Ampled conseguiu angariar apoios valiosos, tendo sido selecionada para participar do processo de aceleração do Start.coop, voltado apenas a cooperativas, e de incubação pelo New Museum.
A plataforma conta atualmente com:
- 3021 usuários
- 291 páginas de artistas aprovadas
- 374 páginas em construção
Por mês, as contribuições do público para os artistas estão alcançando US$ 8.847,88, em média US$ 6,87 de apoio por músico.
Desde o primeiro semestre de 2021, a Ampled tem feito lançamentos coordenados de novas páginas de artistas, agrupadas em “temporadas” e com shows ao vivo.
Com o aumento no número de visitas ao site, a Ampled tem obtido receita adicional com canais de monetização.
As receitas obtidas pela plataforma possibilitaram a contratação de um dos membros da cooperativa em tempo integral.
PRÓXIMAS INICIATIVAS
Estão previstos os lançamentos de novas temporadas com as páginas de artistas recém-concluídas. A ideia é reduzir o individualismo gerado por plataformas como Spotify e Deezer, na opinião dos fundadores da Ampled, e construir um forte senso de comunidade entre os artistas da plataforma, o que possivelmente resultará em novas maneiras de trabalho conjunto.
Continuamente, novos artistas têm manifestado interesse em se juntar à plataforma.