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Como funciona o Corporate Venture no cooperativismo

Traçar os objetivos e escolher o tipo de programa é um dos primeiros passos da jornada de inovação.

GESTÃO DA INOVAÇÃO21/02/202410 minutos de leitura

Existem diversos conceitos e ferramentas associadas à inovação nas grandes organizações que certamente você já ouviu falar: venture capital, intraempreendedorismo, inovação aberta e tantos outros. Seja lá o caminho que uma organização toma, um dos primeiros passos é analisar qual ou quais modelos de Corporate Venture (CV) adotar.

O conceito de Corporate Venture está diretamente ligado com o desenvolvimento da inovação e a renovação de processos, produtos e serviços. Independentemente do modelo de CV, a ideia central é a criação de novos negócios, isolados do core business da organização.

É uma relação ganha-ganha: o Corporate Venture conecta a cooperativa que precisa inovar com empreendedores dispostos a validarem e tocarem seus projetos. Vamos conhecer um pouco melhor a definição e os modelos de Corporate Venture.

Corporate Venture: definição e modelos

Segundo uma pesquisa da Endeavor, Corporate Venture é uma expressão utilizada no mundo dos negócios para caracterizar qualquer esforço de uma corporação para criar iniciativas empreendedoras, internas ou externas.

O termo ganhou relevância nos últimos anos com a constatação de que a inovação é uma necessidade estratégica para se manter competitivo no longo prazo. Por isso, entende-se que as organizações devem investir continuamente em inovação e, assim, assumir uma posição empreendedora e atenta às transformações.

Ao tomar tal posição, um dos caminhos - muito utilizado pelas cooperativas - é a criação de iniciativas empreendedoras a partir de recursos próprios, como pessoas, dinheiro e infraestrutura, dentre outros. É o chamado Corporate Venture Interno (CVI).

O oposto do CVI é o Corporate Venture Externo (CVE). Aqui, além dos recursos internos, busca-se estabelecer alguma forma de interação com empreendedores inovadores, como startups. Isso envolve buscar ideias e conhecimentos fora da cooperativa.

Este modelo nos leva ao Corporate Venture Capital (CVC), no qual a cooperativa pode realizar investimentos no empreendedor, adquirindo participação minoritária, controle parcial ou até total. A seguir, vamos entender um pouco melhor cada um dos três modelos de CV.

Corporate Venture Interno (CVI)

Em resumo, o Corporate Venture Interno - também chamado de intraempreendedorismo - significa apoiar o desenvolvimento de ideias e soluções criadas pelos próprios funcionários. A cooperativa pode apoiar cedendo equipe, estrutura e orçamento até a ideia decolar e se tornar um novo serviço ou produto. Quando isso ocorre, pode acontecer o que chamamos de “spin-off”, ou seja, quando uma ideia se torna um novo negócio.

Mas realizar uma spin-off não é uma regra. Muitas vezes, a nova solução é absorvida pela cooperativa sem necessariamente criar um novo negócio. Portanto, a spin-off é indicada quando se quer atingir um novo nicho de mercado, ampliar a atuação ou porque a solução é muito diferente do negócio principal da organização. Assim sendo, cabe à cooperativa definir qual rumo dará ao projeto.

Para que o CVI exista, porém, é preciso criar um contexto organizacional, como uma incubadora de ideias, que incentive a participação dos colaboradores e trabalhe no desenvolvimento das ideias sugeridas por eles. Afinal, são eles que vivem a rotina da cooperativa e sabem os pontos que merecem atenção ou alguma inovação.

Corporate Venture Externo (CVE)

Como o próprio nome sugere, o Corporate Venture Externo (CVE) se refere ao esforço de criar iniciativas empreendedoras não só com recursos internos. É aqui, então, que a organização se relaciona com as startups, de várias formas e em diferentes níveis de comprometimento e risco.

Existem organizações que elevam esse nível de comprometimento com participação acionária (o famoso equity, como veremos a seguir) e outras que preferem uma parceria mais simples, pautada em desafios pré-estabelecidos.

Listamos a seguir algumas possibilidades de relacionamento com startups sem investimento em troca de participação societária:

• Parceira comercial simples

• Incubação e aceleração sem equity

• Colaboração para projetos internos, para aprendizado mútuo

• Compartilhamento de coworking de inovação

Uma cooperativa pode tanto ajudar quanto aprender com startups. A ajuda, por exemplo, pode ocorrer com o compartilhamento de espaço físico para a startup se desenvolver e também com o ensinamento do que é o modelo cooperativista, visando uma parceria que priorize os princípios do cooperativismo e gere aprendizado mútuo.

E essa troca ajuda no desenvolvimento de uma mentalidade empreendedora e inovadora dentro da cooperativa.

Corporate Venture Capital (CVC)

Agora que você já conhece o CVI e o CVE, é mais simples de entender o Corporate Venture Capital (CVC). Basicamente, significa que uma organização pode adquirir parte do equity de uma startup, que corresponde ao patrimônio líquido dela e representa os valores que cada sócio ou acionista possui na startup.

Esse investimento pode ocorrer das seguintes maneiras:

• Aquisição de participação minoritária, sem aquisição do controle da startup, o qual permanece com os empreendedores;

• Aquisição de controle parcial ou total da startup.

Além de capital, a organização investidora também fornece à startup conhecimentos especializados em diferentes áreas. A cooperativa se beneficia das parcerias, pois tem contato direto com as últimas tecnologias e modelos de negócios que não poderiam ser desenvolvidos internamente em tempo hábil. Já os empreendedores adquirem acesso facilitado ao mercado e a recursos, além de oportunidades de vendas e de acesso à cadeia de valor da cooperativa.

Se esse relacionamento for bem-sucedido, ambos reduzem suas vulnerabilidades e aumentam suas vantagens competitivas. Para se ter uma ideia, 75 das instituições listadas na Fortune 100 possuem algum tipo de relacionamento com empreendedores, internos ou externos, em inovação e novos negócios. Dentre elas, 41 possuem equipes dedicadas exclusivamente à busca de investimentos em startups.

Como fazer Corporate Venture

A cooperativa que se propõe a olhar para o CV deve discutir internamente os reais objetivos do relacionamento com empreendedores. O que se busca? Mudança de mentalidade? Inovação tecnológica em processos, produtos e serviços? Ampliação do portfólio de produtos e serviços?

Com as perguntas e respostas certas, deve haver uma avaliação das alternativas disponíveis para, assim, decidir quais formatos são os mais adequados aos objetivos traçados e ao grau de maturidade em inovação da cooperativa.

Ao final, espera-se que a cooperativa desenhe um modelo que respeite seu grau de maturidade e suas necessidades. A seguir, veja, algumas possibilidades para iniciar o CV na sua cooperativa:

• Programas e eventos, como hackathons, em que os participantes são estimulados a resolverem problemas específicos

• Compartilhamento de espaços físicos, para que cooperativa e startup trabalhem e aprendam juntos

• Programas de incubação e aceleração de ideias nos quais empreendedores (incluindo os próprios colaboradores, no caso do CVI) possuem acesso a mentores

Contratação de algum produto ou serviço do empreendedor pela cooperativa

Colocando essas possibilidades num fluxo, o resultado seria mais ou menos desta forma. A ideia é que, desde que não envolva equity, a cooperativa desenvolva sua própria forma de incubação e aceleração de ideias.

Exemplos de Corporate Venture em cooperativas

O Corporate Venture vem sendo implantado nas cooperativas de diferentes formas. Para ilustrar, trouxemos aqui alguns exemplos práticos.

Unimed VTPR

Um dos primeiros passos da jornada de inovação da Unimed VTRP foi a criação de um programa interno para desenvolvimento de ideias, ou seja, um CVI. Em seguida, a cooperativa decidiu dar mais um passo em sua jornada. Por isso, em 2019, desenvolveu o InnovatiON, programa de CVE para conexões com startups maduras, para resolver desafios pré-determinados de negócio.

Em duas edições, cerca de 350 projetos de startups foram analisados e 5 delas foram contratadas como fornecedoras da Unimed VTRP. A gestão da cooperativa apontou que a iniciativa foi um sucesso, tanto que resultou na implementação de uma plataforma de telemedicina em pouco tempo.

Mas a cooperativa queria ir além. Por isso, em 2020, lançou o Vibee, um hub físico de inovação para identificar e acelerar soluções na área da saúde com foco no relacionamento com startups em fases iniciais. Na prática, é um ambiente que conecta startups com profissionais e organizações da saúde, universidades da região, mentores e potenciais investidores do mercado.

Sicredi Pioneira e Sicredi Caminho das Águas

Por meio do Complexo.lab, que é o seu laboratório de inovação, a Sicredi Pioneira se uniu à Sicredi Caminho das Águas para fazer o Comunitá, primeiro Corporate Venture Capital de cooperativas do Brasil. Executado em parceria com a Ventiur, o Comunitá tem o foco de investir em startups a fim de agregar valor para as comunidades em que as cooperativas atuam.

O Comunitá já é reconhecido nacionalmente como um importante veículo de investimento baseado em propósito, mesmo investindo valores menores do que outras grandes organizações que atuam nesse segmento.

A startup Elysios, que desenvolve ferramentas de agricultura inteligente, é um case de sucesso do Comunitá. “Este é um exemplo de um modelo ganha-ganha-ganha. Ou seja, a cooperativa é investidor-anjo da startup e oferece a solução aos seus associados. Eles utilizam a solução e aumentam a sua produtividade gerando mais renda que, por sua vez, é investida na cooperativa”, conta Thiago Pandolfo, head de inovação do Complexo.lab.

Sicoob Empresas RJ

Em 2016, Eduardo Diniz, diretor-presidente do Sicoob Empresas RJ, realizou uma missão técnica ao Vale do Silício e no retorno também visitou hubs de inovação em São Paulo, onde conheceu ainda mais startups e entendeu qual era a necessidade à época. “Era preciso criar algo para trazer esse ecossistema de inovação para a nossa realidade”, lembra Diniz.

Na verdade, buscava-se mais que relacionamento. A ideia era trocar informações e gerar aprendizado mútuo, com a implantação de novas metodologias de trabalho, mudança de mindset etc, criando uma relação de “ganha-ganha” com as startups. Foi desta forma que surgiu a Plataforma.Space, que inicialmente funcionava apenas como um coworking para startups e cooperados.

Após a inauguração, a estratégia do espaço foi sendo adaptada para que o Sicoob Empresas RJ atingisse seu objetivo. “Iniciamos como coworking aberto a cooperadas startups, mas posteriormente entendemos que o melhor a se fazer seria selecionar startups já operacionais que faziam sentido para a cooperativa, e focar na troca de experiência nessa seleção”, explica Diniz.

Como resultado, pelo menos 10 startups foram contratadas pela cooperativa para melhorar produtos, serviços e, especialmente, processos internos. Diniz cita como exemplo uma startup de gestão de vale-transporte que ajudou a reduzir em cerca de 20% os custos da área.

Sicredi

O Sicredi também possui uma CVE, que é o Inovar Juntos. Em 2019, na sua segunda edição, o programa recebeu 178 inscrições e selecionou nove startups para trabalharem na resolução de oito desafios e na melhoria de processos internos, tanto para cooperados quanto para colaboradores.

A parceria é iniciada com um fase de conexão, no qual as startups se conectam com os times da cooperativa para construírem juntos os projetos de experimentação de cada um dos desafios. Em seguida, na fase piloto, as soluções são testadas em diferentes áreas do Sicredi.

Frísia

Na Frísia, uma das cooperativas mais antigas do ramo agro, já existia contato com startups na feira Digital Agro, realizada anualmente pela cooperativa. Mas era preciso ir além. Por isso, em 2020, a Frísia lançou, entre outras iniciativas, o Digital Agro Connection, programa para selecionar seis startups para trabalharem desafios de Agropecuária Sustentável e Agroindústria 4.0.

Não há equity envolvido na iniciatia. O objetivo do Digital Agro Connection, afinal, é dar suporte às startups para fortalecer o ecossistema e desenvolver o empreendedorismo regional. Para isso, o maior investimento do programa é no desenvolvimento de pessoas e do negócio, por meio de mentorias, networking, consultoria e infraestrutura.

Conclusão

Mesmo não havendo investimento direto nas startups, com a aquisição de equity, várias iniciativas de Corporate Venture vêm surgindo no cooperativismo. Um exemplo é o espaço InovaCoop Goiás, que logo em seu lançamento apresentou um desafio para seleção de startups para dois ramos do cooperativismo goiano: saúde e agro.

E o mais legal é ver as cooperativas adaptarem o conceito à sua necessidade, para inovar com o jeito cooperativista. Inclusive, há espaço para programas que visam a busca ou criação de startups cooperativas (as cooptechs), sejam internas, para uma spin-off, por exemplo; ou externas, adaptando modelos de negócio de startups em estágio inicial.

Em todos os casos, as oportunidades são maiores que os riscos, porque mesmo que a iniciativa não se torne uma solução de fato, já terá valido a pena pelo aprendizado e mudança de mentalidade.

Conteúdo desenvolvido
em parceria com

Coonecta