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Cooperativismo: um modelo de negócio cada vez mais atual e inovador

Demandas atuais dos consumidores já fazem parte do cooperativismo desde sua fundação


Um modelo de negócio feito por pessoas e para as pessoas. Um jeito de empreender colaborativo em que o cooperado é o dono do negócio, a gestão é democrática e o foco vai muito além do desenvolvimento econômico. É dessa forma que podemos resumir o cooperativismo, um modelo econômico-social que gera e distribui riqueza de forma proporcional ao trabalho de cada associado.

Embora seja considerado pela ONU “um modelo de negócios que constrói um mundo melhor”, ainda há certo desconhecimento sobre o cooperativismo. A cada 10 brasileiros, apenas 4 conhecem o cooperativismo, segundo a Pesquisa Nacional do Cooperativismo realizada pela OCB em 2018. Se você faz parte da parcela que desconhece ou tem pouco conhecimento sobre o assunto, continue a leitura e veja como o cooperativismo tem sido cada vez mais atual e inovador.

Um retrato do cooperativismo brasileiro

Os números mostram uma realidade cada vez mais positiva para o cooperativismo no Brasil. Segundo o Anuário Brasileiro do Cooperativismo, produzido pelo Sistema OCB, o setor alcançou a marca de 17,2 milhões de cooperados em 2020, um aumento de 11% em relação a 2019, quando foram registrados 15,5 milhões de cooperados.

Ao todo, são 4.868 cooperativas distribuídas em todas as unidades da federação, atuantes nos sete ramos do cooperativismo. Em 2020, o setor somou 455 mil empregos diretos, um aumento de 6% em relação a 2019. Além disso, podemos destacar:

  • Ativo total de R$ 655 bilhões, um aumento de 33% em relação a 2019;
  • Patrimônio líquido de R$ 145 bilhões, 15% maior em comparação ao ano anterior;
  • Injeção nos cofres públicos de mais de R$ 13 bilhões em tributos, valor 19% maior que o contribuído em 2019;
  • Pagamento de mais de R$ 18 bilhões em salários e outros benefícios aos colaboradores.

Em 2020, em plena pandemia, 161 novas cooperativas foram registradas on-line junto ao Sistema OCB. O modelo é, inclusive, menos suscetível às oscilações de mercado. Enquanto 47% das empresas brasileiras não conseguem sobreviver após 5 anos de atividade, cerca de 50% das cooperativas brasileiras têm mais de 20 anos de atuação no mercado. E 10% delas têm mais de 40 anos de existência.

Mas para entender de fato o cooperativismo precisamos olhar além dos números. Por se preocupar em construir uma sociedade mais justa, o modelo vai ao encontro da preocupação dos consumidores com o impacto social e ambiental dos produtos e serviços que consomem. E acontecimentos atuais como a pandemia de Covid-19 e o aquecimento global acentuaram ainda mais essa questão.

Não é à toa que, por exemplo, a pauta ESG está tão em alta dentre as maiores empresas do planeta. ESG é a sigla para Environmental (meio ambiente), Social (social) e Governance (governança). Em suma, ela remete ao conjunto de valores e critérios éticos que uma companhia desenvolve como objetivo melhorar o seu relacionamento com o meio ambiente e com a sociedade.

Prova do crescimento da preocupação da sociedade com os aspectos defendidos por essa pauta é a migração dos investimentos para fundos que seguem os critérios ESG. Em 2020, negócios e fundos ligados a ESG atraíram US$ 38 trilhões. Para 2025, a expectativa é a de que esse montante chegue a atingir US$ 53 trilhões em todo o planeta, de acordo com dados da Bloomberg. Isso significa 57% dos ativos europeus alocados em fundos com premissas ESG, conforme indicam projeções para 2025 levantadas pela PwC.

O detalhe é que os princípios ESG que o mundo dos negócios começa a descobrir agora é, justamente, a base da existência do cooperativismo há mais de um século. E vai muito além disso, como veremos a seguir.

Para mais informações sobre o que é e como se organiza o cooperativismo, vale a pena dar uma olhada na série de vídeos que a OCB criou para explicar o modelo. Agora, vamos ver algumas das demandas de mercado que mais têm sido exploradas pelas empresas atualmente e para as quais o cooperativismo já tem respostas desde sua criação.

Economia compartilhada

Segundo dados divulgados pelo Sebrae, a previsão é que até o ano de 2025 a economia compartilhada gere rendimentos da ordem de US$ 335 bilhões em receitas em todo o mundo.

Dentre as propostas da economia compartilhada está a democratização do acesso a recursos, que se tornam disponíveis mediante demanda. Provavelmente, o modelo mais clássico utilizado para exemplificar os conceitos da economia compartilhada é o da furadeira. Diz-se que, ao longo de toda a sua vida, uma furadeira doméstica é usada por um total de apenas 14 minutos. Ou seja, alguém compra uma ferramenta dessas para fazer apenas alguns furos por ano, para fixar uma prateleira ou pendurar um quadro. Na maior parte do tempo, o equipamento fica ocioso. Ora, não faria sentido, então, compartilhar a furadeira de alguém e remunerar o proprietário pelo tempo de uso? Essa é a proposta da economia compartilhada.

Em uma escala de negócios, economia compartilhada é, como afirmou o presidente da OCB, Márcio de Freitas, o compartilhamento de bens e serviços para obter melhores resultados para todos. De acordo com ele, as cooperativas já funcionam nos moldes da economia compartilhada desde sua criação.

“Na minha cooperativa - e em todas as outras coops brasileiras - as pessoas já compartilhavam produtos e serviços para gerar trabalho e renda para o grupo”, afirma.

Da mesma maneira, ele conta que as cooperativas também entendem que o compartilhamento de recursos é uma ação em prol da sustentabilidade, pois sempre atuaram tendo em vista o compromisso com o uso racional e sustentável de recursos, fossem eles naturais, financeiros ou humanos.

Outros conceitos que derivam deste mesmo tema são os de economia de propósito e capitalismo consciente. Ambos associam o desenvolvimento de negócios não apenas à geração de lucro, renda e emprego, mas também à promoção do bem-estar de toda a sociedade e preservação do meio ambiente.

Mais uma vez, o cooperativismo saiu na frente, pois tais premissas são parte do DNA das cooperativas, que se propõe a uma causa maior, que é ser capaz de transformar o mundo em um lugar mais justo, feliz, equilibrado e com melhores oportunidades para todos.

Partnership

O modelo de partnership vem sendo exaltado por diversas empresas como fator fundamental para seu crescimento exponencial. Além disso, há muitas startups que também o têm utilizado para tornar colaboradores sócios do negócio.

Embora também tenha foco na retenção de talentos, o modelo de partnership está intimamente ligado à cultura organizacional das empresas que o adotam. A proposta é traduzir em aspectos práticos o discurso meritocrático e valorizar o intraempreendedorismo. Ou seja, o partnership visa também ao engajamento dos colaboradores em torno de um propósito.

Este é, exatamente, o modelo que representa a essência do cooperativismo, em que todos os cooperados são sócios do negócio. No entanto, o cooperativismo vai além, pois a “propriedade” igualitária é reafirmada na prática a partir do direito a voto nas assembleias.

É mais democrático e inclusivo do que os modelos de partnership, em que o colaborador se torna um sócio minoritário. Logo, além de não ter poder de voto, ele pode ser desligado da empresa por meio da compra de sua parcela na sociedade pelo sócio majoritário.

Cashback

Cashback é uma estratégia agressiva de aquisição de clientes, em que as empresas literalmente devolvem dinheiro aos consumidores como forma de atração. Dessa maneira, o cashback serve como um estímulo ao consumidor no sentido de adquirir cada vez mais produtos em lojas participantes.

Como consequência, o cashback ajuda a empresa a aumentar o tíquete médio das vendas realizadas. Da mesma maneira, o cashback ajuda a encurtar a jornada de compra do cliente, pois o bônus oferecido influencia na decisão de compra do cliente, além de estimular a recorrência na compra.

De certa maneira, o cashback já é praticado pelas cooperativas. Afinal, de acordo com as premissas do cooperativismo, todos os associados têm direito aos resultados do exercício, que são chamados de “sobras”.

Na prática, as sobras são como o lucro da cooperativa que é dividido entre os cooperados no final do ano. E, assim como ocorre com o cashback, no caso do cooperativismo de crédito as sobras são revertidas na conta do cliente, que é também o cooperado, e tem rendimentos mensais.

Efeito de rede

Os principais motores da economia - principalmente de negócios digitais - são as plataformas. Ou seja, modelos de negócio que têm como premissa a conexão entre fornecedores e consumidores.

Para que funcionem bem, precisam provocar o chamado efeito de rede. Uma das melhores maneiras de entender como esse efeito funciona é pensando na lógica do telefone. Quando a primeira linha foi instalada, ela não tinha valor algum. Afinal, não havia para quem telefonar. A partir da segunda, o efeito de rede começou a ocorrer, mas foi somente quando milhares de linhas telefônicas entraram em operação que as empresas telefônicas começaram a gerar valor.

No caso das plataformas é a mesma coisa. Uma plataforma de delivery de alimentos só tem valor quando há uma oferta consistente de produtos para uma base ampliada de consumidores. Mais uma vez é o efeito de rede que predomina.

O que parece um conceito novo da economia moderna é, na verdade, a base do funcionamento das cooperativas. Sem, de um lado, centenas ou milhares de cooperados produzindo leite em suas fazendas e, de outro, consumidores dispostos a pagar por tal produção, uma cooperativa não teria razão de existir.

Então, o efeito de rede, assim como para plataformas digitais, é o principal gerador de valor para uma cooperativa. Isso está expresso em diversos princípios do cooperativismo moderno, como, por exemplo, a participação econômica, a intercooperação e o interesse pela comunidade.

Plataformas democráticas

Além do efeito de rede, as plataformas digitais propõem a independência e a autonomia para os trabalhadores que a elas aderirem. A proposta é que os trabalhadores podem trabalhar quando e como quiserem, com a liberdade de acessar ou se desligar da plataforma quando lhes for mais conveniente.

Entretanto, com plataformas mercantilistas dominando mercados inteiros, isso não funciona exatamente assim. Com isso, o que acaba acontecendo é uma distorção nas relações com consequente deterioração das condições de trabalho.

O cooperativismo de plataforma, por sua vez, se mostra uma alternativa viável para este modelo de negócio. Isso porque promove, de fato, a gestão democrática de sua rede, além de fazer a adequada distribuição de valores para os seus interessados por meio das sobras.

Nessas plataformas também prevalecem os princípios do cooperativismo, com gestão democrática e cada cooperado tendo direito a um voto nas decisões a serem tomadas. Assim, o cooperativismo de plataforma alia o melhor das plataformas digitais - a conexão por meio da tecnologia - com o melhor do cooperativismo - uma maior transparência na gestão e distribuição mais igualitária da riqueza.

Alguns exemplos de plataformas baseadas nos preceitos do cooperativismo são a FairBnB, uma cooperativa de hospedagem que reúne anfitriões e membros de comunidades para não apenas explorar o negócio de hospitalidade, mas decidir como será desenvolvida a atividade turística em cada região.

Outro exemplo é a Stocksy United, que, na prática, se organiza como um banco de vídeos e imagens de propriedade compartilhada dos próprios artistas. É a mesma proposta de, por exemplo, Resonate e Ampled, que se posicionam como plataformas de streaming de música cuja propriedade é dos próprios artistas.

Dados valiosos

Dentre os temas mais em alta no mundo dos negócios na atualidade está a proteção aos dados pessoais dos consumidores. Não é raro ver no noticiário empresas que tiveram de arcar com multas milionárias devido ao vazamento ou uso indevido de dados pessoais.

E, a bem da verdade, mesmo com a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), não é fácil para o cidadão comum entender como seus dados são usados por parte das empresas com as quais ele interage.

Essa problemática acabou por dar origem a uma outra vertente, que, seguindo os princípios do cooperativismo, tem se mostrado uma alternativa interessante para garantir a proteção de dados. É o caso de cooperativas de plataforma como a Savvy, que, atuando com dados médicos, mantém os pacientes no controle do uso de seus dados de saúde.

Outro exemplo é a cooperativa Driver’s Seat, que criou um aplicativo para motoristas de aplicativo usarem em paralelo ao Uber ou a qualquer plataforma similar. O app gera dados para duas finalidades: 1) para apoiar o motorista, com informações como cálculo de quilômetros rodados, onde estão as melhores corridas, desgaste do carro etc.; e 2) para vender a órgãos públicos, consultorias ou entidades de pesquisa.

Ao vender esses dados, o valor é revertido para os próprios motoristas. Como exemplo, a Driver’s Seat vendeu dados de mobilidade para uma agência municipal da cidade de São Francisco, nos EUA, por cerca de 45 mil dólares.

Conclusão

É certo que o mundo dos negócios tem mudado em uma velocidade cada vez maior. Há uma tendência de fazer com que os negócios digitais atuais se aproximem de aspectos mais humanos, com respeito a individualidades e base no compartilhamento de recursos, esforços e valores.

Esse é um movimento, no entanto, que o cooperativismo já faz desde sua criação, pautada pela gestão democrática, pela sustentabilidade em sua expressão mais ampla e pela geração de valor para a sociedade como um todo.

Não que o cooperativismo não tenha a aprender com as novas tendências. É preciso, sim, que as cooperativas - e as pessoas que as fazem - se reinventem, mas principalmente para desenvolver maneiras de incorporar tecnologia, agilidade e velocidade aos seus princípios e valores.

Afinal, por um lado as empresas mercantilistas estão em busca de princípios que estão presentes no cooperativismo. Mas, de outro, as cooperativas estão desenvolvendo seu próprio entendimento sobre a importância da inovação para melhoria constante de seus negócios e sustentabilidade de seus negócios.

Por isso, se você está à procura de um modelo de negócio que tenha princípios cada vez mais atuais, como colaboração, preocupação com a comunidade e gestão democrática, este modelo é cooperativismo. Empreender de forma cooperativa pode ser o futuro dos negócios!

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