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Principais tendências para as cooperativas do Ramo Infraestrutura

Mudança de comportamento das pessoas e cidades em transformação demandam infraestruturas cada vez mais sustentáveis 

TENDÊNCIAS22/06/202111 minutos de leitura

Há mais de 80 anos as cooperativas brasileiras de infraestrutura se dedicam à prestação de serviços básicos como distribuição e geração de energia elétrica, água, saneamento básico, irrigação, entre outros. E mais recentemente, com a reclassificação promovida pelo Sistema OCB em 2019, o ramo ficou ainda mais amplo.

Isso porque as cooperativas habitacionais passaram a fazer parte do Ramo Infraestrutura, além da incorporação de novas iniciativas, como a prestação de serviços de telecomunicações. A atuação diversificada reflete bem o papel do cooperativismo que é atender às necessidades e buscar soluções para seus cooperados e comunidade.

Hoje, ao todo, são oito segmentos principais no ramo: água e saneamento; construção civil habitacional; construção civil comercial; desenvolvimento; distribuição de energia; geração de energia; irrigação; e telecomunicações.

Na proporção, as cooperativas habitacionais (30%) e as de distribuição de energia (26%) representam mais da metade do ramo, que conta, no total, com 265 cooperativas e mais de 1,1 milhão de cooperados, segundo dados do Anuário do Cooperativismo Brasileiro 2020, produzido pelo Sistema OCB.

Contexto desafiador

Independentemente da atuação da cooperativa, o contexto é desafiador. Pois, de certa forma, a pandemia evidenciou o déficit de infraestrutura social existente entre as camadas mais pobres da população em boa parte do mundo. E no Brasil não seria diferente.

Sem infraestrutura, um país perde produtividade e competitividade, sem contar os baixos níveis de desenvolvimento social. Portanto, os investimentos são mais que necessários, são urgentes.

De acordo com estudos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a América Latina e o Caribe precisam de investimentos anuais da ordem de 2,5% (150 bilhões de dólares) do PIB de toda a região durante pelo menos uma década e meia, especialmente em setores ligados à produção e distribuição de energia, transportes, telecomunicações e construção civil.

Inclusive, na área da construção, o déficit habitacional só vem aumentando no Brasil. Segundo dados da Fundação João Pinheiro, levantados até 2019, o país precisa de 5,8 milhões de moradias - número que, segundo especialistas, já cresceu devido à pandemia. Além disso, 14,2 milhões possuem carência de infraestrutura urbana e 11,2 milhões de moradias possuem carências edilícias. Portanto, o total de domicílios inadequados no país corresponde a 24,8 milhões.

Vale lembrar que um dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), criados pela Organização das Nações Unidas (ONU), trata exatamente da necessidade de investimentos em infraestrutura e em inovação, que, segundo a entidade, são condições básicas para o crescimento econômico e para o desenvolvimento das nações.

Tendências e oportunidades para as cooperativas de infraestrutura

Se há desafios, também há oportunidades. Por isso, exploramos um dos principais estudos mundiais sobre o tema, que aponta perspectivas do setor para os próximos 10 anos e pode ajudar as cooperativas em suas tomadas de decisão.

Produzido pela KPMG International, o relatório Emerging Trends In Infrastructure 2021 (Tendências Emergentes em Infraestrutura 2021) aponta tendências relacionadas a um conjunto de fatores que englobam não só tecnologia, mas também a conjuntura socioeconômica, aspirações sociais de natureza comportamental e conceitos de sustentabilidade. Sem esquecer, é claro, dos efeitos da pandemia.

Veja a seguir as principais tendências e como elas impactam as cooperativas brasileiras de infraestrutura.

1. Planejamentos e processos mais flexíveis

O primeiro tópico do estudo aponta que o setor precisa de uma abordagem mais ágil e flexível para o planejamento, desenvolvimento e entrega da infraestrutura. Isso se torna necessário porque, hoje, vivemos num cenário de alta incerteza, que pode exigir planos reservas para prever e prevenir situações.

Os especialistas da KPMG lembram que, desde 2016, a companhia aponta que os players de infraestrutura tinham muito a aprender com os líderes de tecnologia, que possuem maior capacidade de se reinventar, recalibrar projetos e se moldar de forma ágil e flexível a um mercado em constante evolução.

Em termos de tendências, a consultoria vislumbra a necessidade de estudar os métodos mais eficazes de utilizar Data Analytics, aproveitando, por exemplo, tecnologias, como a Internet das Coisas, para otimizar operações e manutenções.

Também será preciso, mais do que nunca, acompanhar atentamente o comportamento das pessoas, para detectar suas principais necessidades em infraestrutura, sobretudo as novas formas de viver e trabalhar. Afinal, a pandemia impôs a necessidade de repensar desde as formas de interação social até a intensidade e relevância da tecnologia em absolutamente todos os segmentos - o que afeta diretamente as entregas da cooperativa.

2. Cidades com crise de identidade e em transformação

Outro fato é inegável: atualmente, as pessoas estão cada vez mais focadas no seu próprio tempo, segurança e conveniência, com padrões diferentes de vida, trabalho e diversão. E essa nova realidade impacta em como enxergamos as cidades.

Na prática, isso significa que o que hoje torna uma cidade atraente para viver, trabalhar e se divertir não necessariamente tem a ver com o que priorizávamos no passado recente. Por exemplo, em meio à pandemia, houve quem preferiu se mudar para o interior, “abandonando” a cidade grande.

A consultoria prevê que os modelos híbridos devem ganhar cada vez mais espaço - e, assim, cidades grandes já não serão o único “ímã” a atrair pessoas, ideias e negócios. Logo, é possível prever que cidades pequenas passem a demandar infraestrutura de cidade maior, em especial de telecomunicações, imóveis comerciais etc.

No interior do Rio Grande do Sul, por exemplo, a Coprel Telecom - coligada à Coprel Cooperativa de Geração de Energia e Desenvolvimento - viu os pedidos de banda larga aumentarem mais de 20% no início da pandemia, em 2020. Para atender à demanda, a solução veio com a intercooperação.

Foram intensificados os investimentos de ampliação e construção de novas redes de internet em conjunto com outras cooperativas. Algumas cooperativas parceiras disponibilizaram suas estruturas e recursos financeiros, a exemplo da Cooperativa Agrícola de Água Santa (Coasa), que contribuiu para levar internet para seus associados durante a crise.

Quando o assunto é o futuro das cidades, não podemos esquecer das “smart cities”, ou seja, as cidades inteligentes que conseguem se desenvolver economicamente ao mesmo tempo em que aumentam a qualidade de vida dos habitantes ao gerar eficiência nas operações urbanas.

Atrelada a essa tendência, temos também as redes inteligentes de energia elétrica, as “smart grids”, que já estão bem difundidas nos Estados Unidos e em alguns países da Europa, da Ásia e até do Oriente Médio, mas ainda com pouco avanço no Brasil.

3. Meio ambiente, enfoque social e governança

Sua cooperativa tem colocado em prática o ESG? Se ainda não, deveria. ESG é a sigla em inglês para environmental, social and governance (ambiental, social e governança, em português), que serve para medir as práticas ambientais, sociais e de governança de uma organização.

Ou seja, pode ser usada para dizer quanto um negócio busca formas de minimizar seus impactos no meio ambiente, construir um mundo mais justo e responsável para as pessoas em seu entorno e manter os melhores processos de administração. Um exemplo nesse sentido é a cooperativa Certel , que, por meio de uma intercooperação com cooperativas do Sicredi, tem ampliado sua geração de energia renovável e limpa.

De acordo com o relatório da KPMG, se antes já havia um despertar para a agenda ESG, a pandemia acelerou esse anseio por uma infraestrutura que contemple aspectos ambientais, sociais e de governança, de modo que o seu desenvolvimento contribua para um mundo mais justo, inclusivo e equitativo.

De certa forma, a pandemia coletivizou o desejo de reconstruir do zero com sustentabilidade e bem-estar, além da vontade de reparo de desigualdades e os desequilíbrios coletivos. Ou seja, a agenda ESG chegou para valer no ramo de infraestrutura.

Um dos tópicos neste tema é a promoção da eficiência energética, com democratização do acesso aos benefícios gerados por essa infraestrutura. A expectativa é de valorização dos micro e pequenos produtores, com inclusão dos mais vulneráveis nos sistemas financeiros e produtivos.

Essa é justamente a proposta da Ciclos, a cooperativa de plataforma do Sicoob ES, que proporciona acesso dos cooperados a energia elétrica fotovoltaica. Na prática, os associados conseguem reduções de até 80% em seus custos com energia elétrica.

Outra iniciativa nesse sentido é a Cooperativa de Energia Solar (Coopsolar). Fundada em 2019, ela visa a geração compartilhada de energia através de fontes renováveis. Construída com recursos dos próprios cooperados, a cooperativa já começa a dar os primeiros resultados: a primeira usina foi concluída em meados de 2020 e tem capacidade de geração de 75 kWp, com 240 painéis solares fotovoltaicos instalados no solo de um terreno localizado em Praia Bela, município de Pitimbú, na Paraíba. Veja essa e outras iniciativas semelhantes no site Energia Cooperativa.

4. Mundo digital e poder público

A realidade é que as tecnologias de conectividade serão fundamentais para impulsionar a inovação e o valor da infraestrutura. Diversas pesquisas já constataram que a pandemia acelerou, de fato, os processos de digitalização que estavam em curso há anos, antecipando a adesão maciça a ferramentas virtuais de trabalho, armazenamento e tráfego de dados.

Os entes governamentais atuarão em frentes de incentivo à economia digital, implementando ou provendo melhorias em acesso à internet, largura de banda e tecnologias de conectividade, que incluem o 5G e a nuvem.

Ter em foco esses elementos será fundamental para planejar, delinear e colocar em curso projetos de infraestrutura que correspondam aos anseios e às necessidades do momento que vivemos e do futuro próximo.

O estudo conclui que o foco na conectividade tende a se intensificar, com os governos cientes de suas deficiências em infraestrutura digital e empenhados em dirimir essas lacunas para, desse modo, impulsionarem o crescimento de suas economias.

Vale lembrar que, em 2020, o ramo infraestrutura se beneficiou da aprovação de duas leis: a 14.109, que trata da utilização de recursos do Fust para conectividade rural; e a 14.108, sobre desoneração da internet das coisas. As novas legislações garantem um ambiente favorável para o avanço da conectividade rural, considerando que um dos grandes empecilhos para a implantação de infraestrutura de internet no campo era justamente o fomento a projetos com essa finalidade, por meio de financiamentos com custo acessível.

Com o incentivo a diferentes arranjos produtivos para essa atividade, as novas legislações vão estimular consequentemente o fortalecimento das cooperativas de telecomunicações, além da possibilidade de intercooperação para cooperativas agropecuárias, de infraestrutura e de crédito.

5. Parcerias público-privadas

Ampliando o raciocínio do tópico anterior, a KPMG afirma que alguns governos devem procurar parceiros e começar a reconsiderar o papel que o setor privado desempenha não apenas na entrega de ativos, mas também na entrega de serviços.

De acordo com a consultoria, há anos o setor privado vem assumindo um papel mais ativo na entrega e operação de ativos e serviços de infraestrutura, com relevância crescente na captação, no financiamento e no fornecimento da infraestrutura governamental.

Em alguns casos, as parcerias serão necessárias muito por conta do ônus da pandemia aos governos, que buscarão modelos alternativos. Em outros, novas parcerias serão motivadas mais pela inovação e desejo de entregar mais às partes interessadas. O fato é que elas são imprescindíveis para que as soluções de infraestrutura sejam entregues de fato.

É importante entender e ressaltar que as perdas que a pandemia acarretou aos cofres públicos são um elemento a mais de pressão para que os governos busquem modelos alternativos de cooperação e negócios.

6. Novos modelos de financiamento

Por fim, a consultoria ressalta que as novas opções de financiamento para o setor de infraestrutura têm crescido de forma consistente nos últimos anos, proporcionando, sobretudo aos governos, chances sem precedentes de aproveitar as diferentes fontes de recursos, incluindo capital institucional e fundos sustentáveis, além dos bancos locais e regionais e mercados de capitais.

Atualmente, os investidores tendem a priorizar as oportunidades que acenam com retornos de longo prazo sustentáveis e protegidos contra a inflação. Essa tendência é hoje especialmente válida no Brasil, onde as taxas dos títulos do tesouro se tornaram relativamente baixas quando comparadas com 5 anos atrás.

Atento a esse movimento, o Sicredi buscou recursos fora do país , firmando acordo de parceria para captação com a International Finance Corporation (IFC), membro do Grupo Banco Mundial, para estimular projetos de energia solar. A linha de crédito internacional é de US$ 120 milhões (cerca de R$ 600 milhões) e vai financiar projetos de energia solar dos cooperados Sicredi em todo o Brasil.

Esta é a primeira operação de uma instituição financeira cooperativa brasileira a receber certificação emitida pela Climate Bonds Initiative (CBI), organização internacional que atua para promover investimentos na economia de baixo carbono, estabelecendo as melhores práticas para o mercado em termos de integridade ambiental dos produtos de economia verde. A operação também detém certificação pelo Green Loan Principles (GLP), que atesta que os projetos oferecem benefícios ambientais claros e verificáveis e que os processos de avaliação e seleção, assim como a gestão dos recursos e o seu monitoramento, seguem padrões internacionais.

Conclusão

Essas foram algumas tendências principais que elencamos do estudo da KPMG. E como vivemos em um mundo em constante mudança, ainda mais depois da pandemia de Covid-19, nossa recomendação final é clara: procure sempre estar atento às tendências para manter e ampliar a competitividade e sustentabilidade da sua cooperativa. Por isso, fique ligado em nossos conteúdos e acesse agora o nosso curso online “Pesquisador de Tendências”, aqui no InovaCoop.

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